Não me poderia despedir de 2010 sem fazer uma breve menção a um pequeno e  maravilhoso livro que descobri este ano. Falo acerca de "Sempre Vivemos  no Castelo" de Shirley Jackson. Li-o numa viagem que me levou do Porto a Mina de S. Domingos (concelho de Mértola), e graças a ele compreendi algo mais sobre a exclusão.
Esta obra, editada em 1962, centra-se na vida de Mary 
Katherine "
Merricat" 
Blackwood, uma jovem de 18 anos que vive numa pequena vila dos Estados Unidos juntamente com a sua irmã mais velha, 
Constance, e com o seu tio idoso, Julian - os únicos que sobreviveram ao trágico envenenamento da família 
Blackwood. Os primeiros parágrafos consistem numa apresentação, distante dos cânones e na primeira pessoa, de 
Merricat, uma jovem no mínimo peculiar. Acompanhamos 
Merricat  numa das suas idas semanas à vila, e cedo nos apercebemos que a maioria  dos habitantes  da vila há muito tempo que excluiu os sobreviventes da  família 
Blackwood daquilo que vagamente designamos de comunidade. Muitas questões despontam sobre as razões que levaram a esta 
ostracização, e é este mistério que funciona como fio condutor da narrativa. Para além da 
estória,  contada de uma forma magistral por Jackson, é de sublinhar a componente  moral desta obra escrita nos anos pós Segunda Guerra Mundial. A autora  consegue sublimar para o papel o sentimento de hostilidade dirigido aos  intelectuais, e aos judeus, que a própria sofreu aquando da sua mudança  para o meio rural norte-americano (estado do 
Vermont).
Actualmente, em Portugal, talvez vivamos uma situação parecida, só que no nosso caso é a crescente 
desertificação  do Interior que coloca quem ainda vive nas aldeias numa situação de   exclusão. Entre o Porto e Mértola tive a oportunidade de ver desfilar  diante dos meus olhos um país de contrastes. A paisagem ia-se  modificando à medida que eu descia pelo Litoral do país, mas foi somente  quando deixei a costa e fui para o Interior que me dei conta da  disparidade entre  estes dois mundos. Más estradas e 
infraestruturas públicas, baixa densidade 
populacional  e uma insuficiente rede de apoio social, a par com o demarcado  envelhecimento da população, fazem de muitas aldeias locais de solidão. O  meu coração, neste Natal, está com todos aqueles que sobrevivem no  abandono.
Christina's World de Andrew WyethJP